Registo horário
Meia-noite: Frio. Mais frio que ontem. Materiais, tudo no lugar, não tugem nem mugem. Chegou o carregamento de baldes, plástico bom. São só meia-dúzia mas o estaleiro já parece outro.
Uma da manhã: Os tijolos continuam a aborrecer-me. Estão demasiado bem-dispostos. Quando volto da ronda, apanho sempre algum fora do lugar. Se continuarem, vou ter que tomar medidas extremas.
Uma da manhã e dois minutos: Pronto, já está! Acabaram de conhecer o martelo. Os materiais nem sempre têm razão.
Duas da manhã: As madeiras começam a apresentar sérios sinais de stress. Está a ser difícil mantê-las no lugar. Tenho a sensação que ando a ser espiado por dois tubos de esgoto.
Três da manhã: O cascalho inicia um processo de boicote. Está instalado um clima de medo e tensão geral. A revolução dos materiais pode rebentar a qualquer instante. Estou sozinho.
Quatro da manhã: Uma corda atacou-me pelas costas. Desconheço os motivos da sua revolta. Estou encurralado e o balde olha para mim com um olhar furioso. Não sei quanto tempo mais conseguirei aguentar sozinho. Se ao menos a manhã chegasse. Os baldes novos estão do meu lado.
Cinco da manhã: O tijolo que eu pensava que era diferente, afinal é como os outros. São todos iguais, todos iguais, todos iguais.
Seis da manhã: Se alguém estiver a ler este registo, é porque os materiais levaram a melhor.